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A nova estrela do verão

Os espumantes rosés prometem fazer a festa no fim de ano e na estação do Sol

Marcos Pivetta/www.jornaldovinho.com.br*

26/12/2006

Cave Geisse Rosé: 5 172 garrafas de um espumante brut, feito 100% com uvas tintas da cepa Pinot Noir da safra 2003 (Foto: Divulgação)

Pegando carona no sucesso dos versáteis e renovados vinhos rosés, que melhoraram de qualidade e voltaram a freqüentar as boas mesas, um irmão borbulhante passou a ser convidado para as festas: os champanhes e espumantes rosés, que devem ser a sensação das comemorações de fim de ano e do verão. Atentos às tendências do efervescente mercado brasileiro, produtores nacionais e importadores, que já vinham apostando e se dando bem com os rosés sem bolhas, reforçaram agora as fichas nos espumantes e champanhes dessa tonalidade. Quem não tinha um rosado borbulhante tratou de arrumar um. E quem já tinha trouxe mais do mesmo e aumentou o estoque com novos rótulos. Toda essa movimentação propicia ao consumidor um leque razoável de opções, em várias faixas de preços, dos espumantes nacionais na casa dos R$ 20 ou R$ 30 e terminando aos champanhes exclusivos de três ou quatro dígitos.

Entre os produtores brasileiros, a Cave de Amadeu, boa vinícola de Pinto Bandeira, distrito de Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, foi a que lançou o espumante rosé nacional mais sofisticado e caro. Em novembro, a empresa começou a vender as 5 172 garrafas do Cave Geisse Rosé, feito 100% com uvas tintas da cepa Pinot Noir da safra 2003. “Sempre tivemos em nossos planos fazermos um espumante rosé de alto nível”, conta Daniel Geisse, diretor comercial da vinícola, especializada na produção de vinhos borbulhantes, todos feitos com uvas de uma única colheita e sempre pelo chamado método tradicional ou champenoise (com a segunda fermentação, aquela que confere as bolhinhas de gás carbônico ao vinho, ocorrendo dentro da garrafa). “Sabíamos da tendência de supervalorizar os rosés e começamos o trabalho nesse produto há praticamente quatro anos.” O Cave Geisse Rosé permaneceu cerca de três anos envelhecendo nas caves da empresa antes chegar ao mercado a um preço em torno de R$ 80 a garrafa.

A Miolo, uma das maiores e mais agressivas vinícolas nacionais, também resolveu investir num espumante rosado. Depois de ter lançado em julho seu brut top de linha, o Miolo Millésime (veja matéria com as novidades em termos de vinhos borbulhantes não-rosés disponibilizadas por algumas vinícolas nacionais), a empresa apresentou em outubro o seu Brut Rosé. Trata-se de um corte (blend), das uvas Chardonnay, Pinot Noir e Merlot, também feito pelo método champenoise, que ficou seis meses amadurecendo na vinícola antes de chegar às lojas. No último Effervescents du Monde, concurso internacional que confronta apenas espumantes, ocorrido em novembro passado na França, o Brut Rosé ganhou medalha de prata. Seu preço gira em torno de R$ 20 a R$ 25. O espumante também é vendido em garrafas de 1,5 litro. Foi o segundo vinho rosé que a Miolo lançou neste ano. Antes, a empresa havia criado um rosé tranqüilo (sem borbulhas) para a linha Seleção.

Hoje à frente de sua própria vinícola em Garibaldi, na Serra Gaúcha, o enólogo Adolfo Lona, que foi um dos primeiros a investir nas borbulhas rosadas, com o início da produção, há duas décadas e meia, do primeiro espumante rosé da marca De Gréville, sempre acreditou no potencial de vendas desse tipo de produto. “O mercado brasileiro, dinâmico e imprevisível, está descobrindo esse espumante tão gastronômico e atrativo e a moda na Europa (dos rosés em geral) pode ter influenciado positivamente”, afirma Lona, que produz o Adolfo Lona Brut Rosé, o mais vendido de sua pequena linha de quatro espumantes. “Devemos lembrar que, pela cor e sabor, o rosé atrai muito as mulheres, que são as impulsionadoras do consumo de espumantes em todo o mundo. Os homens ainda têm preconceito com esse tipo de vinho, mas as restrições desaparecem quando experimentam o produto.” Apesar do sucesso de público de seu rosé, Lona ainda acha mais fácil comercializar espumantes brancos do tipo brut e moscatéis (doces). “O nosso rosé vende bem porque é o mais barato dos nossos espumantes e porque sempre demos muito foco nele”, comenta o enólogo. Feito pelo método charmat (com a segunda fermentação em grandes tanques de aço inox), o Adolfo Lona Brut Rosé, que custa cerca de R$ 25 e do qual foram produzidas 36 mil garrafas, é um blend de Pinot Noir (60%) e Chardonnay (40%), com uvas de apenas uma safra.

A produção nacional de espumantes de todos os tipos e cores deve crescer cerca de 20% neste ano, atingindo aproximadamente 9 milhões de garrafas comercializadas. O peso dos rosés nessa estatística ainda é mínimo, mas, se os bons ventos continuarem soprando a favor desse tipo de espumante, seu consumo deve continuar em alta. Até o Vale do São Francisco, uma nova fronteira vitivinícola, na divisa de Pernambuco e da Bahia, já fabrica espumantes rosés. A ViniBrasil, associação da importadora paulista Expand e dos portugueses da Dão Sul, acaba de lançar o espumante Rio Sol Rosé, feito pelo método Charmat exclusivamente com uvas Syrah, cepa tinta que se adapta bem a climas quentes, como o do Nordeste. A linha borbulhante da ViniBrasil, aliás, conta também com espumantes brut, demi-sec (meio doce) e doce. Todos na faixa dos R$ 25/R$ 30.

Como nasce a cor dos rosés – Como qualquer outro espumante ou champanhe, os rosés borbulhantes podem ser feitos pelos métodos champenoise, o único autorizado na região francesa de Champanhe (que admite apenas as uvas Chardonnay, Pinot Noir e Pinot Meunier em seu blend), ou Charmat. No processo champanhês, a segunda fermentação, aquela que faz o vinho adquirir as bolhinhas de gás carbônico, ocorre dentro da própria garrafa que será comercializada. No método Charmat, menos artesanal, a tomada de espuma acontece em grandes tanques de aço inox. Os diferentes tons rosados exibidos pelos espumantes e champanhes rosés (e pelos rosés em geral) podem ser obtidos de duas formas: pela mistura de vinhos, brancos e tintos, ou por uma rápida maceração, de poucas horas do suco de uva recém-prensado com as cascas de cepas tintas pouco antes do início da fermentação alcoólica. Nesse caso, é o contato com as cascas que dá a cor do espumante.

Muita gente torce o nariz para o primeiro método, associando-o a produtos de menor qualidade. Mas a maior parte do champanhe rosé é confeccionada por essa técnica, indício de que ela em si não deve ser tão ruim assim desde que os vinhos empregado no blend sejam de qualidade. Em termos olfativos, os aromas dominantes dos espumantes e champanhes rosés costumam ser associadas a frutas vermelhas, como cerejas e morangos. Os mais complexos, sobretudo os champanhes, podem exibir diferentes notas, como as de tostado. A despeito da aura de frivolidade que paira sobre essa cor de vinho, é interessante notar que os champanhes rosés costumam ser um pouco mais caros que os champanhes brancos.

Até recentemente, lançar um rosé no Brasil, espumante ou tranqüilo, era uma operação de alto risco. Quase ninguém falava bem ou parecia consumir esse tipo de produto, pelo menos não em público. Vistos como uma versão engarrafada do brega, com imagem associada a rótulos adocicados e ruins, os vinhos rosados (com exceção dos champanhes rosés, que sempre gozaram de prestígio e são caros) pareciam ser um produto de segunda categoria. Agora a percepção do público mudou, os rótulos se aprimoraram e as vendas deslancharam. “Quando começamos a comercializar nossos rosés, tínhamos medo de que eles encalhassem”, admite Flavio Piagentini, diretor de Companhia Piagentini, que tem sede em São Paulo e produz vinhos em Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, e em Andradas, em Minas Gerais. A vinícola tem dois rosés, um sem borbulhas, e um espumante, o Brut Rosé Família Piagentini, um corte das uvas tintas Pinotage (80%) e Merlot (20%), cuja primeira versão foi lançada há dois anos e contabilizava somente 3 mil garrafas. Neste ano, o espumante rosado, que custa em torno dos R$ 20 e é elaborado pelo método Charmat, chega às prateleiras dos supermercados com uma tiragem ainda modesta, mas bem maior, de 16 mil garrafas.

Maior produtora de espumantes do país, tendo superado no ano passado a Chandon, líder histórica nesse segmento, a Salton deve fechar 2006 com um aumento de 20% em suas vendas do produto. Até a virada de ano, três milhões de garrafas borbulhantes terão saído da moderna vinícola da empresa, situada em Tuiuty, distrito de Bento Gonçalves. De sua vasta gama de espumantes, ainda não consta um rosé. Mas a lacuna será logo preenchida. “Teremos 28 mil garrafas de espumante rosé para comercializar ainda no verão de 2007, provavelmente em janeiro”, diz Angelo Salton, presidente da vinícola, que há alguns anos foi pioneira ao investir, com sucesso, em espumantes leves e frutados feitos com a uva Prosecco. Outra vinícola que promete desovar em 2007 um rosé com borbulhas é a Pizzato. “Estamos amadurecendo até a idéia de fazer um espumante tinto”, conta Ivo Pizzato, enólogo da pequena vinícola de Bento Gonçalves. Hoje a Chandon e a Casa Valduga já contam com espumantes tintos em sua linha de produtos.

O gás dos importados – Quem traz rótulos de fora também não pode reclamar da onda rosé que pode inundar o verão. A importadora Decanter, que tem sede em Blumenau, Santa Catarina, e conta com filiais em Florianópolis, Joinville e São Paulo, estava praticamente sem vinhos rosados tranqüilos para vender no início de dezembro. “Finalmente os rosés explodiram”, comemora Guilherme Correa, sommelier da importadora. “É um tipo de vinho que tem tudo a ver com o nosso clima e com os nossos costumes à mesa.” O estoque de alguns produtos já havia sido reposto, mas, a pouco dias das festas de fim de ano, a importadora ainda esperava a chegada de novas remessas. O interessante é que a febre rosada contaminou o setor de espumantes. A versão rosé do espumante francês Kriter, uma novidade que a Decanter começou a trazer neste ano, vendeu em um mês 600 garrafas. Um bom desempenho para um produto que custa cerca R$ 60. A procura pelo champanhe Barnaut Authentique Rosé Brut Grand Cru, pequeno produtor da vila de Bouzy, também surpreendeu. Ainda mais quando se sabe que se trata de um produto para a faixa mais alta do mercado (R$ 184).

Otávio Lilla, da importadora Mistral, de São Paulo, também concorda que há um interesse crescente por todos os vinhos rosados, incluindo os espumantes. “Há muitos anos, insistimos na qualidade desses vinhos e sugerimos aos clientes que os experimentem”, afirma Otávio, que detecta um grande aumento na comercialização desse tipo de produto. Contudo, ele acha que ainda não é possível dizer que os vinhos ou espumantes rosados estejam vendendo muito. O motivo é simples: a procura pelos rosés aumentou, mas as vendas ainda são pequenas se comparadas à de outros tipos de vinho. “O importante, no entanto, é que a imagem dos rosés está em alta e eles finalmente começam a ser descobertos pelos apreciadores de vinhos de qualidade”, pondera Otávio. No amplo catálogo da Mistral, pode-se escolher borbulhas rosadas para os mais diversos bolsos e gostos. Há, por exemplo, o champanhe rosé da renomada casa Pol Roger, que a importadora traz há vários anos e custa cerca de US$ 130. Ou o raríssimo e caro (US$ 329) Bollinger Grande Année Rosé Brut 1999, produzido apenas em anos especiais, do qual a Mistral conseguiu uma cota de apenas 48 garrafas, sendo que duas delas foram destinadas à fiscalização do Ministério da Agricultura. Ou ainda borbulhas ibéricas mais em conta e importadas em quantidades maiores, casos do espumante rosado feito com a uva Baga pelo produtor português Luis Pato (US$ 26.90) ou a cava espanhola Jane Ventura Rosado Brut (US$ 32,90).

Investir nas borbulhas realmente dá resultados. Isso já ficou claro para o produtor nacional, que faz bons e competitivos espumantes, e também para quem traz rótulos do exterior. Neste ano, a World Wine, divisão de vinhos da importadora paulista La Pastina, ampliou seu portifólio de champanhes de uma para seis marcas. À Delbeck, primeira marca trazida pela importadora, vieram se somar Salon, Delamotte, Egly-Ouriet, Jacquesson e Pierre Moncuit. Em termos de faturamento, as vendas de champanhe, um produto caro que quase sempre custa no mínimo três dígitos e pode chegar a quatro, praticamente triplicaram. A importadora trouxe dois champanhes rosés brut, o Delbeck e e Egly-Ouriet, e eles não fizeram feio. O Egly-Ouriet, que custa R$ 240, chegou a acabar, mas a World Wine pediu nova remessa. “Os rosés estão na moda e já não são mais vistos como antigamente”, diz Silvia Pena, gerente de marketing da importadora. No caso dos espumantes e champanhes rosés, produtores e importadores esperam que a moda atual seja duradoura – e não apenas uma bolha de consumo.

*Esta matéria foi originalmente publicada na edição de dezembro de 2006 do jornal Bon Vivant

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